sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Carta da Sociedade de Patologia (Portal Médico) ao presidente, comentada

Me deparei com a carta que o presidente da "Sociedade de Patologia" escreveu ao presidente da república (que, recentemente, manifestou-se contra o Ato Médico) e ao ministro da saúde. Copiarei-a aqui, para "admiração" dos colegas.

No mais, a partir da leitura da breve correspondência, qualquer um pode perceber que não existe absolutamente nenhum argumento embasado que reitere o "Ato Médico" como um avanço para a saúde no país. Todos eles, aliás, reforçam a formação médica, a importância dos diagnósticos de doenças fornecidos, e até apelam para o "emocional" ao relembrar os tumores de Dilma e José de Alencar, pessoas próximas ao presidente.

Ninguém aqui está discutindo isso. Não se trata de desmerecer a formação médica e a importância de seus serviços para a sociedade - é claro que são imprescindíveis. E, convenhamos, diagnosticar tumores no vice-presidente seria o mínimo esperado de um médico, não? Se não, pra que serviria a formação em medicina? Não é necessário exaltar algo que faz parte do trabalho do médico (assim como mecânicos consertam motores, pintores pintam paredes, dentistas cuidam dos dentes...). Se não existem argumentos convincentes de que o "Ato Médico" é necessário, faz parte do desenvolvimento da saúde pública (o que, de fato, não há!), não existem motivos para apelar pro lado emocional dos resultados de trabalhos médicos e exaltar aquilo que vocês têm mesmo que exercer na profissão.

O que acontece é que o desenvolvimento da saúde caminha pra um desenvolvimento que pressupõe duas coisas: a primeira, a descentralização dos saberes sobre saúde do papel do médico (ou seja, o "Ato Médico" é uma precipitada contramão no projeto de saúde) e, consequentemente, as relações mais horizontais entre os profissionais, exaltando a ideia de equipe multidisciplinar, complexa, que debate numa junção de vários saberes mais específicos aquilo que ocorre com o indivíduo. Em segundo lugar, também se pressupõe um maior investimento na promoção de saúde, além da prevenção, e não mais o lugar "clássico" de que tratar de saúde é tratar de doença; sendo assim, o serviço não irá se pautar em diagnósticos, curas e etc (claro que, quando necessário, estará pronto para isso), mas sim no "evitar adoecer".

Muita gente vem discutindo isso atualmente, nas universidades, nos serviços de saúde, na política. Programas como o SUS, a Estratégia de Saúde da Família, o HumanizaSUS, aprimoramentos em saúde Brasil afora, tudo converge nesse sentido de "superação" do centramento do médico e da doença. Talvez se vocês, médicos (deixo claro aqui que também não me refiro a todos, e sim àqueles favoráveis ao "Ato Médico") se inteirassem disso tudo e deixassem a "redoma mágica de aura da profissão-mestre" que cada vez mais é superada, conseguiriam enxergar o "Ato Médico" como um retrocesso na saúde, um empecilho pra todo esse investimento na melhoria da saúde.

Existe muito mais mundo, muito mais sociedade, do que o próprio umbigo de vocês e o próprio consultoriozinho particular. Se inteirem mais, do que acontece por aí.

Marcos M. Casadore
Estudante de Psicologia (Unesp/Assis)

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O presidente da Sociedade Brasileira de Patologia (SBP), Celso Rubens Vieira e Silva, manifesta a preocupação da classe quanto à necessidade da aprovação do “Ato Médico” pelo Senado Federal e pelo presidente da República no que diz respeito ao diagnóstico de doenças dever ser realizado exclusivamente pelos médicos patologistas e citopatologistas que possuem certificação e experiência necessária para tal avaliação.


São Paulo, 17 de novembro de 2009.

Excelentíssimo Senhor Luiz Inácio Lula da Silva
Presidente da República do Brasil

Ex.mo Sr. Ministro da Saúde – Dr. José Gomes Temporão


Excelentíssimo Senhor Presidente,

Este é um momento histórico para a medicina brasileira, com a eminência da aprovação do “Ato Médico” pelo Senado Federal e a expectativa de posterior aprovação do texto legislativo por vossa excelência.

Este assunto foi recentemente abordado no “9º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva”, que contou com vossa participação.

Representando os médicos patologistas deste país, temos a obrigação de enfatizar que os diagnósticos das doenças, inclusive quando identificadas nos laudos anatomopatológicos e citopatológicos, são de competência exclusiva dos médicos patologistas e citopatologistas. Estes profissionais têm formação médica completa, residência especializada de 3 anos ou mais (em instituições autorizadas pelo MEC), com título de Especialista emitido, por concurso, pela Sociedade Brasileira de Patologia e reconhecido pela Associação Médica Brasileira e Conselho Regional de Medicina.

É necessário conhecer bem essa atividade, que não pode ser exercida por profissional sem treinamento médico especializado ou com formação insuficiente para lidar com questões fundamentais, como o “diagnóstico e tratamento das doenças”.

Exemplos recentes, que ressaltam o papel do Médico Patologista no Diagnóstico e Tratamento dos pacientes, são os tumores, que infelizmente, afetaram o nosso querido Vice-Presidente José Alencar Gomes da Silva e a digna Ministra Dilma Rousseff.

Como a aprovação da lei do “Ato Médico” irá depender de vossa assinatura, o Ministro da Saúde será um importante assessor a ser consultado sobre a relevância da regulamentação da Medicina, em atenção aos interesses do povo brasileiro, por uma assistência médica de qualidade.

Obrigado pela atenção. Colocamo-nos à disposição para qualquer informação adicional.

Dr. Celso Rubens Vieira e Silva
Médico Patologista – CRM-BA: 16674
Presidente da Sociedade Brasileira de Patologia

Um comentário:

  1. Parabenizo a iniciativa da criação deste espaço, colocando aqui minha humilde opinião de que o Presidente Lula, nesse início de campanha eleitoral que elegerá um sucessor que mantenha a essência política de seu governo, não permitirá a validação deste projeto de lei que vai de encontro a toda a reforma efetivada no sistema de saúde brasileiro.
    Um dos princípios doutrinários do SUS é a INTEGRALIDADE, no qual o sistema de saúde deve considerar a pessoa como um todo, devendo as ações de saúde procurar atender à todas as suas necessidades. Todos sabemos, desde o presidente ao mais humilde cidadão deste país, que um médico não se preocupa com o que está além da doença. Seu papel sempre foi procurar os sintomas de uma doença em uma pessoa doente, e tentar eliminá-los. Poucos, muito poucos se preocupam com o contrário, com a PESSOA que está com sintomas de uma doença. Inclusive deve ter sido eles que inventaram o termo "portador", para mim a pior forma de referir-se à uma pessoa que apresenta sintomas de alguma enfermidade.
    Qualquer pessoa que consulte um médico nunca sairá de seu consultório sem uma prescrição medicamentosa, mesmo que o seu problema possa ser eliminado através de mudança de hábitos. Mas será que um médico terá coragem para dizer ao seu "paciente" que o melhor para ele não é um medicamento e sim uma terapia cognitivo-comportamental que inclua os conhecimentos da Psicologia e da Terapia Ocupacional? Será que ele admitiria que os conhecimentos de outros profissionais de saúde serão mais eficientes para este paciente que os seus?
    A Lei do Ato Médico não é a regulamentação de uma atividade, é a regulamentação da ignorância e o SUS não sobreviverá se isso acontecer.
    E o presidente sabe muito bem disso...

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