O artigo seguinte, escrito pelo médico-presidente do Conselho Federal de Medicina, foi publicado na Folha de SP na quinta-feira, dia 12 de novembro deste ano. Achei vergonhosos os argumentos de Roberto D'avilla, todos contraditórios e muitas vezes repetitivos. Ele escreveu dum lugar prévio, no qual o Projeto de Lei seria a salvação da saúde no país. Vergonhoso sim, porque é de tal modo alienado e tendencioso que cidadãos que não estão interados acerca do projeto de Lei podem ler e julgarem sem conhecê-lo: "Que bom, estão fazendo algo bom pra saúde do país". Isso é uma mentira deslavada e sem sentido, um projeto que quebra todo o avanço multidisciplinar das práticas de saúde e tenta retomar o posicionamento "central" e "único" do médico nos serviços. Quem são esses médicos que julgam-se tão superiores assim para abordar sozinhos todos os casos que envolvem a saúde? Por acaso, conhecem eles sobre fisioterapia, nutrição, psicologia, dentre tantas outras profissões? O médico em questão sequer aborda diretamente essas questões. Que desvalorização alteritária é essa, e a troco de quê? Pra mim, a troco de "poder" e garantias de centralidade do saber médico, unicamente. Talvez venham sentido a perda do espaço de único e mais poderoso saber das ciências da saúde, e agora querem retomar aquele antigo espaço por outros meios. Uma VERGONHA, com letra maiúscula! Segue, então, o artigo, para quem ainda não leu. Tirem suas conclusões.
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A regulamentação da medicina
ROBERTO LUIZ D'AVILA
O CONGRESSO está a um passo de aprovar uma lei que representa uma conquista para a saúde no Brasil. Após ser aprovada com 292 votos favoráveis pela Câmara, seguiu para apreciação do Senado a proposta que regulamenta o exercício da medicina no país.
Apesar da aparente obviedade sobre qual o papel dos 344.034 médicos na assistência à população brasileira, o projeto de lei 7.703/2006 preenche uma lacuna importante ao definir de forma clara e objetiva os atos privativos desses profissionais e aqueles que podem ser compartilhados com as outras 13 categorias vinculadas ao campo da saúde.
O texto não elimina os avanços alcançados pela multidisciplinariedade da atenção em saúde. Pelo contrário, valoriza o espaço de enfermeiros, fisioterapeutas, nutricionistas, psicólogos, biólogos, biomédicos, farmacêuticos, fonoaudiólogos, profissionais de educação física, terapeutas ocupacionais e técnicos e tecnólogos de radiologia, entre outros, ao ressaltar o que as regulamentações de cada uma dessas categorias já fizeram quando definiram o escopo de suas atuações.
O projeto de lei não impede que todos esses profissionais participem ativamente das ações de promoção da saúde, de prevenção de doenças e da reabilitação dos enfermos e pessoas que vivem com deficiências.
Na verdade, ele estimula a mútua colaboração entre todos os profissionais da saúde -dentro de suas respectivas competências-, com o objetivo único de garantir o bem-estar individual e coletivo dos cidadãos.
Mas o projeto vai além e assegura algo a que todo brasileiro deve ter direito: a garantia de que o diagnóstico de seu problema de saúde e de que o tratamento para enfrentá-lo, assim como a realização de procedimentos invasivos capazes de gerar risco de vida, sejam realizados por um médico devidamente capacitado, avaliado e fiscalizado por instâncias de controle profissional, como os 28 conselhos federal e regionais de medicina, além das associações e sociedades médicas.
A confirmação dessa conquista pelo Senado, prevista para as próximas semanas, consolidará o senso comum e a jurisprudência existente sobre o assunto, aprovadas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Quando adoecemos, queremos ser atendidos por médicos. Quando nossos filhos, pais e irmãos adoecem, queremos que um médico investigue as causas do problema, faça o diagnóstico e oriente sobre o que fazer.
Com a ampliação e a especialização dos diferentes campos do conhecimento, é claro que outros profissionais podem participar na recuperação da saúde dos pacientes. Porém, cabe ao médico o diagnóstico e o tratamento das doenças, principalmente em razão de sua formação profissional e pela credibilidade e confiança atribuídas a ele pelos pacientes.
A população passa ser a grande beneficiada com a mudança, pois contará com uma linha de cuidados integral e articulada dentro de princípios de competência e responsabilidade.
Isso trará maior segurança e proteção aos pacientes ao contribuir para evitar distorções que colocam a vida e o bem-estar de todos em risco.
As recomendações e as prescrições passarão a ser implementadas segundo critérios rígidos e científicos que asseguram que o indivíduo será avaliado de forma holística, integral, e não apenas em função de sinais e sintomas que nem sempre refletem a real dimensão de uma doença ou um agravo de saúde.
Por outro lado, a legislação será também um instrumento de aperfeiçoamento do próprio Sistema Único de Saúde (SUS), ao exigir que os gestores, em todas as esferas (federal, estadual e municipal), contem com médicos em suas equipes.
Essa é uma maneira de enfrentar a iniquidade do acesso à saúde no país, evitando que só recebam a orientação de profissionais da medicina quem tiver recursos para pagar uma consulta ou um plano privado de saúde.
A sociedade aguarda por essa mudança, que não pode demorar mais. A regulamentação do exercício da medicina não prejudica categorias profissionais nem cerceia direitos. Na realidade, ela cumpre a função de tornar cristalino o espectro das responsabilidades e das competências da atividade médica, fundamental para o cuidado da saúde do ser humano.
O tema, que está sobre a mesa dos senadores, é urgente e imprescindível para transformar o que existe de fato também em um direito. A saúde do Brasil espera por isso.
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ROBERTO LUIZ D'AVILA , cardiologista, médico do trabalho, mestre em neurociências e comportamento, é professor adjunto da Universidade Federal de Santa Catarina e presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM).
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